JARDIM DOS ENCONTROS
Lugar de encontrar palavras, devaneios, imagens e sonhos plantados a esmo.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Da série GRANDES SABERES DA HUMANIDADE: Aritmética

A matemática é simples: eu demiti todo o elenco, porque nenhum deles correspondia à minha concepção do personagem. Agora não tenho ninguém e o espaço vazio no palco me incomoda.

vários - vários = zero

(Então porque a angústia?)

Não é nem que eles não fossem bons, não tivessem seus méritos, não estivessem se esforçando lá ao modo deles... mas a verdade é que eu queria explosões shakesperianas e eles me ofereciam uma interpretação com ares de Malhação. Eu amo o desvario, a Loucura, amo as tragédias, as falhas e precipitações que se abatem sobre o herói mas os atores que eu escolhera estavam preocupados demais com o penteado ou a hora que partia o último ônibus, e isso me dava uma certa agonia.

Uma das coisas mais lindas que eu acho no mundo é gente concentrada. Talvez porque eu seja uma tonta-multi-foco-diletante por natureza, eu simplesmente babo por qualquer pessoa que esteja efetivamente imersa no fazer de alguma coisa. Qualquer coisa, e por vezes os fazeres mais mecânicos são os que mais me geram suspiros de admiração. E lhes faltava isso, não por escolha, mas por alguma falha inata. Não havia nada a fazer que não aceitar o erro.

Mas eu insisti, porque eu sempre insisto de alguma maneira.

Só que vendo os olhares preocupados em consultar o relógio a cada novo ensaio, aquele ar distante de quem não sabia bem como responder aos seus próprios impulsos de criação, aquele aparvalhamento, eis que eu me desinteressei sinceramente. E perdi de fato a paciência, porque o tom errado da voz durante cada diálogo, a eterna intenção mal escolhida pro texto, a falta de entendimento da coisa toda me deu uma chateação que não tinha mais fim. E explica, re-explica, desenha, demonstra, faz no lugar do outro, repete e re-repete, eu cheguei à conclusão que nem a mais sólida vontade poderia modificar a verdade: era o elenco errado para a peça certa.

Agora o palco está vazio. E, no teatro, uma das coisas mais difíceis certamente seja acolher o silêncio e apenas encarar a ausência. Sem música, sem paliativos, sem substitutos, sem galãs-enlatados, sem truques fajutos; agora é o momento de voltar à sala de ensaio e re-conceber os desejos. O passo seguinte é apurar o olhar e procurar os novos integrantes desse elenco, que talvez possa ser feito de um, uma ou vários novamente. Nenhuma resposta é relevante neste momento, porque ainda é hora de fazer as boas perguntas. Em breve eu publico no mural a lista dos novos selecionados.

Por enquanto, repito-me o mantra recém aprendido: às vezes o mais difícil a fazer é não fazer nada.

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